sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Altura de água debaixo da quilha

(As citações neste artigo são copiadas do sitio de Internet do Instituto Hidrográfico (IH) - http://www.hidrografico.pt, exceto se for referido explicitamente outra fonte)

Um dos exercícios no exame para patrão local é calcular a profundidade abaixo da quilha, ou dito de outra forma a altura de água abaixo da quilha, ou melhor ainda quanto falta para encalharmos.

Este exercício até não conta muito e eu considero-o muito importante. Na prática, teremos que o fazer sempre que precisamos de saber se conseguimos passar ou não num determinado canal, por exemplo.

O conceito mais importante a compreender é o de "Zero Hidrográfico", doravante referido simplesmente pela sigla ZH.

Eu sugiro, a quem tem dificuldade em fazer este tipo de exercícios, que perca uns bons minutos a compreender o que raio é o ZH. Para tal tento explicar aqui a necessidade de um plano de referência, como se calculou para Portugal e como usar.

Plano/Nível de referência

Todos nós sabemos que o mar tem marés, e tem mais marés que marinheiros :) Perguntem-se a vocês mesmo, como conseguiríamos colocar na carta náutica a altura de água ou profundidade de determinado ponto se o raio do mar não pára quieto e está sempre a encher e a vazar! Pior ainda, em certas alturas varia com determinada amplitude outras varia com outra amplitude.

Por isso, é necessário ter uma "maré fixa" ou dito de forma mais correta, um plano de superfície do mar de referência! Depois será reportar as profundidades em relação a esse plano independentemente das marés, pois é um plano fixo. Essas profundidades reportadas na carta são denominadas de "Sondas reduzidas".

Aliás, não só reportamos a profundidade nas cartas náuticas em relação a esse plano, como as próprias marés passam a ser reportadas também em relação a esse plano de referência! Quando se diz que é uma baixa-mar de 1,2 metros, quer dizer que o plano de água nessa baixa bar está 1,2 metros acima do plano de referência.

Desta forma, podemos separar os dois problemas: temos os "homenzinhos" que andam a medir profundidades para colocar na carta sem se preocuparem com marés; e temos os "homenzinhos" que andam a simular e prever as marés sem se preocuparem com as profundidades de cada ponto! Seria bonito termos que descarregar tabelas de marés para cada ponto da carta náutica!!! :D

Portanto, a definição final de ZH "é o plano de referência em relação ao qual são referidas as sondas e as linhas isobatimétricas nas cartas náuticas, e as previsões de altura de maré que figuram nas Tabelas de Marés do Instituto Hidrográfico."

Determinação do ZH

O plano de referência tem que ser algo muito bem definido. Poderíamos escolher a média das marés de um determinado ano como plano de referência (teríamos baixas-mar negativas e preias-mar positivas).

Mas não se escolheu a média de marés. Escolheu-se um plano abaixo da mais baixa baixa-mar em Portugal. Eu deduzo que a razão desta escolha foi para ter profundidades nas cartas náuticas que "quase" nunca serão atingidas. Desta forma, quando vemos que determinado local tem profundidade de 2 metros marcados na carta, sabemos que terá sempre mais de 2 metros de água.

Isto só não será verdade quando tivermos uma baixa-mar negativa, que, em principio, será um fenómeno excecional e que poderia por si só obrigar a reformular o ZH!

No caso de Portugal, nas cartas portuguesas, o ZH fica "situado abaixo do nível da maré astronómica mais baixa, pelo que as previsões de altura de maré são sempre positivas."

Ao descarregarem  uma tabela de marés do sitio do IH, por exemplo para Viana do Castelo, ele vem com as seguintes notas que transcrevo de seguida:

«4. ZERO HIDROGRÁFICO:
  • 2,00 m abaixo do nível médio adoptado (Cascais, 1938).
  • 5,076 m abaixo da marca de contacto (MC).
  • 6,833 m abaixo da marca de nivelamento A251 (DGP), existente no molhe central (junto a um cabeço).
  • 17,822 m abaixo da marca de nivelamento principal NP27 (IGP) existente no lado esquerdo da porta principal da estação de caminhos de ferro de Viana do Castelo
»

Portanto, parece que para Portugal o ZH foi determinado retirando 2 metros ao nível médio do mar em Cascais na ano de 1938.

Calcular altura de água

Ora agora que sabemos que:
  • Profundidades apresentadas na carta são relativas ao ZH
  • Tabelas de marés são relativas ao ZH

Podemos então daterminar a altura de água em determinado ponto.

Exemplo:
Digamos que a entrada de um porto tem na carta uma profundidade de 2 metros. Digamos também que prevemos chegar ao porto na altura de baixa-mar que, pela tabela de marés será de 0,6 metros.

Portanto, pela carta náutica sabemos que o ZH à entrada do porto está 2 metros acima do fundo de mar; i.e. a "sonda reduzida" são 2m. Ainda acima disso, na altura da baixa-mar, vamos ter mais 0,6 metros de água. Portanto quer dizer que vamos ter um total de 2,6 metros de altura de água.

Agora que sabemos a altura total da água sobre o fundo do mar à entrada do porto na altura prevista da nossa chegada, podemos também calcular a altura de água que teremos debaixo da quilha, ou dito de outra forma, a que altura do fundo estará a parte mais baixa do nosso barco. Claro que para isso necessitamos saber o calado da nossa embarcação.

Se, por exemplo, o calado da nossa embarcação for 1,2 metros, então teremos 2,6 metros de altura de água menos 1,2 metros do nosso calado, que significa que temos ainda 1,4 metros de água debaixo da nossa quilha.


Medidas usadas para calcular altura de água debaixo da quilha



Boas Aprendizagens, Pedro Braga

domingo, 27 de novembro de 2011

Partes da vela

Ora aí estão os nomes das partes importantes das velas. Numa embarcação temos que ter nomes bem definidos para podermos comunicar com outros tripulantes.




Como exemplo peguei numa imagem obtida de um conhecido fabricante de veleiros e sobrepus as indicações:





Boas Aprendizagens, Pedro Braga

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Luzes das embarcações - Fundeado, Desgovernado e encalhado


Inserido no RIEAM, Regulamento Internacional para Evitar Abalroamentos no Mar, está a definição dos sinais sonoros (para condições de visibilidade reduzida) e dos sinais visuais diurnos e nocturnos que as embarcações devem utilizar para sinalizar a sua condição (fundeado, em marcha, encalhado, em faina de pesca, etc.), direcção e intenções.

As luzes e balões é mesmo questão de decorar. Mesmo a relação das luzes com os balões parece às vezes completamente ilógica! Mas acredito que haverá boas razões por trás das escolhas.

Mesmo assim vou tentar dar algumas dicas e formas de associar as luzes a cada situação. Vou aproveitar as "formulas" que me foram ensinadas nas aulas. Algumas são boas ajudas para não nos esquecermos.


Fundeado, Desgovernado e Encalhado


Estas três situações são sinalizadas de dia com um, dois ou três balões esféricos. Por serem sinalizadas só por balões esféricos, será uma boa ideia agrupá-los numa mnemónica. Podemos fazer de duas formas:
  1. ordenamos pela sequencia 1 balão, 2 balões e 3 balões: neste caso decorem "FDE" que corresponde a "123" balões respectivamente.
  2. ordenamos alfabeticamente pelo nome da situação, que fica "DEF": neste caso decorem "231" que corresponde às situações "DEF" respectivamente
Eu por acaso usei o método dois. Pois era mais fácil para mim decorar o "231" e manter a simplicidade das letras (correspondem à tecla 3 do telemóvel). Neste sistema, decorem que começamos pelo fim: 1 balão para o fim "Fundeado" :) , e depois voltamos ao inicio para 2 e 3 balões, respectivamente.

As luzes destas situações são:
Fundeado = 1 balão = luzes brancas de mastro visíveis em 360º (1 ou 2 para >50m)
Desgovernado = 2 balões = 2 luzes vermelhas visíveis em 360º + luzes bordo
Encalhado = 3 balões = 2 luzes vermelhas (não é um erro, são mesmo só duas luzes vermelhas) visiveis em 360º + luzes brancas (de fundeado) 


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Para referência na embarcação, encontrei um site que vende um poster que pode ser encomendado em diversos tamanhos e suportes (papel, cartão, etc.).
Cartaz à venda em zazzle.pt

Boas Aprendizagens,
Pedro Braga

sábado, 22 de outubro de 2011

Pontos notáveis

As cartas de marear têm imensa informação e há muito o que dizer sobre elas!

Eu aqui vou só abordar uma pequeníssima parte da "arte" de navegar usando a carta: os pontos de referência na carta dos objectos notáveis em terra (e em mar).

E porquê abordar este ponto?... porque numa das minhas aulas de Patrão Local, uma pessoa disse que deveria traçar o azimute na carta no ponto mais alto do desenho de um depósito de água, pois é esse ponto do objecto real que ele vê quando está no mar! (como se houvesse equivalência do desenho com a posição do depósito de água - quer dizer, até havia se ele estivesse deitado :P)

Claro que a afirmação que essa pessoa fez está completamente errada. Eu tenho uma divisão perfeitamente clara na minha mente entre dois tipos de informação da carta. Chamemos-lhe (1) informação de "identidade" (inventei agora mesmo :P ) e (2) informação "geográfica".

(1) a informação de identidade eu refiro-me a desenhos que ajudam ao navegador a identificar sem dúvidas o objecto que está a ser retratado (têm aqui um bom catálogo desses símbolos). Estes desenhos podem-se extender na carta ou até ser desviados do ponto geográfico onde o objecto esta por meio de referências ou "setas". O que interessa perceber é que estes "retratos" ou identificadores não têm informação geográfica!!! ok? percebido? É a isto que eu chamo informação para identificar objectos, portanto "identificativa".

(2) a informação geográfica é aquela que define geograficamente a posição do objecto identificado pela informação de "identidade". Normalmente, esta informação será em forma de uma pequena circunferência! Porque normalmente os objectos retratados são tão pequenos à escala que se resumem a um ponto na carta.

O exercicio em causa, na aula, dizia a determinada altura que:
Às 1300 horas obtém uma posição definida por:
Depósito de água da praia da Tocha       Zv = 124º
Este azimute deverá ser traçado na carta usando o ponto na base do depósito da água como referência, como se pode ver na imagem:
Azimute traçado ao depósito de água pelo circulo na base do desenho


No seguinte exemplo vemos três símbolos que ilustram esta separação entre a marcação da posição do objecto ("position is at bottom") e o resto do símbolo que, pela sua forma, nos diz se é uma antena parabólica, um mastro de bandeira, uma chaminé ou outros de entre um rol considerável de símbolos.

Já agora fica aqui a referência de onde veio esta imagem: "SÍMBOLOS, ABREVIATURAS Y TÉRMINOS USADOS EN LAS CARTAS NÁUTICAS", do "SERVICIO HIDROGRÁFICO Y OCEANOGRÁFICO DE LA ARMADA DE CHILE". (link no fim)

Portanto, usar o desenho que identifica o depósito de água traçando um azimute da parte de cima do desenho é completamente errado (para não dizer ridículo). Deverá haver um ponto de referência geográfico associado a esse desenho, normalmente na base do desenho, e esse sim indica onde está localizado o objecto notável. É esse ponto que devem usar para traçar os azimutes.

Na imagem seguinte, reparem que todas os farolins de balizagem e boias têm um pequeno circulo branco na sua base. Podem reparar no pormenor aumentado no quadrado direito com dois faróis. Esse pequeno circulo branco é que define (2) a posição geográfica exacta da boia na carta. Tudo o que está para cima é só para (1) identificar que farolim/boia é.




Podemos reparar na imagem anterior que existe também um farol representado por uma estrela. Nesse caso o circulo está no interior da estrela. Os faróis, que não os de balizagem, são sempre representados por uma estrela com o circulo no meio.
Os faróis principais de costa são para ser visto de mais longe para uma primeira identificação da costa, por isso são mais altos (neste exemplo 34 metros) e mais potentes (neste caso alcança 20 milhas). Os farolins do sistema de balizagem já é para a abordagem a portos e canais; portanto basta terem alcances mais curtos (neste caso 4 e 6 milhas) e são normalmente mais pequenos (4, 7 e 12 metros).

Fontes de informação:

- www.shoa.cl/servicios/descargas/pdf/carta1_2008.pdf - "SÍMBOLOS, ABREVIATURAS Y TÉRMINOS USADOS EN LAS CARTAS NÁUTICAS", do "SERVICIO HIDROGRÁFICO Y OCEANOGRÁFICO DE LA ARMADA DE CHILE"

- http://websig.hidrografico.pt/www/content/documentacao/legislacao/livraria_simbolos.zip - Livraria de símbolos para a produção da cartografia hidrográfica, do nosso "Instituto Hidrográfico" da Marinha Portuguesa. NOTA: eu não cheguei a ver este conteúdo! Como estamos num país muito fino, teria que ter um Software todo XPTO, hiper-mega-fixe (AutoCAD) todo profissional que custa uma pipa de massa. Nem uns simples conversores :S

Boas aprendizagens,
Pedro Braga

sábado, 8 de outubro de 2011

Circulo Máximo


Os truques e mezinhas que, felizmente, os nossos professores nos fornecem, por vezes induzem ao erro por parte dos alunos menos "estudiosos" que só procuram forma simples e rápida de passar aos exames. Esquecendo-se logo de seguida de todos os ensinamentos que receberam durante a preparação.

Um bom exemplo de como se pode induzir conhecimentos errados a estes alunos é a de noção de "Circulo Máximo". Esta definição geométrica é usada na definição geográfica de alguns termos que se usa na náutica. A simplificação que se faz aqui é que o globo terrestre se aproxima a uma esfera (achatamento ~= 0,0033671 e excentricidade ~= 0,0819927).

A mezinha que se ensina nas aulas de patrão local é: Círculos Máximos são o equador e os meridianos e mais nada! Aqui tenta-se evitar que algum aluno diga que um paralelo é um circulo máximo.

O problema é que, quem nunca privou com geometria nem teve cadeiras como Geometria Descritiva, facilmente afirmará a pés juntos que Circulo Máximo é o equador e os meridianos! E nem lhe passará pela cabeça que, usando a mesma aproximação do globo terrestre com uma esfera, existam mais círculos máximos que não são o equador nem os meridianos!

Para quem ainda não percebeu ou não concorde com esta minha afirmação, deixo-lhes aqui um desafio. Como interpretam as seguintes definições que se podem encontrar nos manuais náuticos de navegação:

"a menor distância entre dois pontos na superfície da Terra (considerada esférica para os fins comuns da navegação) é o arco de círculo máximo que os une, ou seja, uma ortodromia."
> aqui a pergunta é: para se ver a menor distância entre dois pontos, eles têm sempre que estar no equador ou no mesmo meridiano? pensem lá bem...

"Círculos máximos, exceto o equador e os meridianos, não são representados por linhas retas (...)"
> esta é uma das limitações da projecção de Mercator. Será que o autor desta frase estava maluco e andava a ver outros círculos máximos que não o equador e os meridianos?...

Pois bem, um circulo máximo é a figura geométrica resultante da intersepção de um plano por uma esfera quando o centro da esfera é coincidente com um ponto do plano. (esta é a minha definição... acho que estará aceitável. Sugestões e correcções são bem vindas :) )
Nos manuais de náutica poderemos encontrar uma definição mais geográfica (se bem que circulo não é circunferência, mas...) :
"CÍRCULO MÁXIMO: é a linha que resulta da interseção com a superfície terrestre de um plano que contenha o CENTRO DA TERRA."

Alguns links onde poderão ver esta definição ilustrada e explicada:

http://es.wikipedia.org/wiki/Gran_Círculo - Definição de Circulo Máximo (Gran Círculo) na Wikipedia em Espanhol
http://www.mar.mil.br/dhn/bhmn/download/cap1.pdf - Manual da Marinha Brasileira


Boas aprendizagens,
Pedro Braga